quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Mulher e Lua




Noite. Mistério. Insondável beleza.


Ó Lua, companheira da minha condição, sou a mulher desdobrada em mil que, contigo enlaçada, viaja no tempo, sujeita a ciclos de nascimento, vida e morte.


Venho escutar de novo os teus sussurros, como nas noites de outrora em que, pelo grande pássaro celeste, me entregavas o fruto das minhas entranhas.


Durmo contigo, ó lua, lua lânguida e serena sob a minha mão amante na hora mágica em que a feiticeira dos olhos de prata activa os fluidos misteriosos e dança com o lobo, em diálogo íntimo com o cosmos.


Todas as antigas civilizações veneravam o mistério do nosso laço, vozes remotas ecoam ainda nos éteres cânticos de amor à grande Deusa Tripla, Mãe Geradora, espelhada na vastidão das águas primordiais donde a vida procedeu.


Depois, tudo se apagou. Tudo se esqueceu.


Passaram a chamar-te pelo nome científico. Só os poetas retiveram nos olhos esclarecidos e no coração dourado a memória azul do teu mistério. Talvez por eles, ouça eu agora de novo, ó guardiã prateada, o silêncio como flor a florir e redescubra o fluxo dos meus gestos que se abrem na verdade do meu sentir – cresço e decresço, danço e repouso, em mim germina a vibratória pulsação da vida a renovar-se, apareço e desapareço, sou meia, sou uma quarta parte para logo, plena, me revelar sensorial e íntima, código de vida não decifrado.


Ó lua oculta, baixas dos céus pelo ardor úmido do meu corpo fecundo e penetras a terra com o teu bafo fertilizante. Senhora Lua Senhora Terra, entre as duas mães me descubro a contento, pois é doce teu olhar, luz da noite, mesmo quando trajada de branco e negro destróis as formas gastas em busca de nova criação.


Dormindo com a lua sonho-me para além do previsível. Desfeitos os absurdos formatos recebidos, esgueiro-me, ousada, na transcendência do que em mim conheço.


Do alto dos céus, governas esse mágico reino noturno que alberga os meus sonhos, reino onde me transformo em mulher-lua mulher-pássaro e vivo em insuspeita liberdade a respiração do meu antigo e feminino canto.


Durmo contigo, Lua, danço contigo, sonho-te e sigo-te na viagem.


Na noite da vida, roçam o meu corpo expectante os tentáculos dos teus devaneios oníricos na gira cósmica pelo grande fundo universal.


MARIANA INVERNO


Fonte: http://wwwjaneladaalma.blogspot.com/

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